Locadoras, nostalgia e os geradores de lero lero
Conforme vou envelhecendo, percebo que, por diminuir o contato com pessoas mais novas, acabo não entendendo muitas vezes os desafios que as gerações mais novas enfrentam.
Uma forma de tentar superar isso um pouco, que confesso estar longe de ser a ideal, mas que gosto, é ver vídeos de pessoas mais novas falando sobre suas experiências e opiniões. Não para ser o “tiozão” que tenta se enturmar com jovens, mas realmente para entender o que ainda é igual e o que mudou desde que deixei de ser um jovem adulto.
Nessas “andanças” pelo Youtube, acabei me deparando com dois vídeo do Bruno Rataque que me chamaram a atenção. Um sobre mídias físicas e outro sobre TVs de tubo. Esses vídeos são interessantes não só pelo fator nostalgia, mas também por que foram produzidor por alguém que não viveu ou pouco viveu essa época. Bruno conseguiu entender várias das sensações e sentimentos, mas outras não conseguiu apresentar justamente por não ter vivenciado (ou por não serem objetivo do vídeo).
E é sobre uma dessas experiências que hoje, ao me deparar com uma chamada de um portal de tecnologia brasileiro que dizia “Como pedir ao Chat GPT recomendações de filmes e séries”, fiquei refletindo.
Na época das locadoras, seja de jogos ou de filmes, a coisa mais comum era conversar com os atendentes, tanto para pedir recomendações, como para trocar experiências.
Aqui preciso fazer um grande aparte: sou extremamente introvertido. Sei que isso pode parecer estranho, já que tenho canal no Youtube, Instagram, etc, mas sempre fui e ainda sou. Fazer lives, vídeos é uma forma de me ajudar a superar os medos e inseguranças de ser introvertido (que tem suas vantagens também, mas é tema para algum dia).
Voltando ao assunto, mesmo sendo introvertido, adorava essa experiência de poder conversar com alguém que não só entendia de jogos ou filmes, mas que efetivamente gostava de conversar sobre esses assuntos. Não era raro a pessoa que estava me atendendo indicar algo que eu não conhecia, como também sequer iria pensar em alugar. Ou até mesmo o inverso, eu indicar algo que a pessoa não conhecia.
Desde que os serviços de streaming se popularizaram, nunca existiu um paralelo a essa experiência. As plataformas de streaming dizem sugerir conteúdo baseado nos seus gostos, mas na prática contratos e interesses comerciais fazem com que você seja empurrado para o que as plataformas, estúdios ou gravadoras querem. O Spotify nem esconde isso.
Para piorar, com a popularização e banalização de que o uso de LLMs¹ seria uma forma de inteligência, de interação quase humana, vemos difundida a ideia de que um gerador e reprodutor de textos seria capaz de substituir ou até mesmo superar a experiência e contato humanos.
“Perguntar” algo para um gerador de lero lero moderno, não tem absolutamente nada a ver com a experiência de conversar com pessoas. Pessoas que entendem, gostam e tem sentimentos sobre jogos, filmes, séries, livros, músicas, etc.
Não é nostalgia querer que essas pequenas experiências sociais que nos fazem humanos continuem existindo. Infelizmente é mais um dos sintomas do capitalismo tardio desses tempos que vivemos, em que tudo deve ser automatizado, desumanizado, robotizado e, claro, monetizado. Principalmente se isso incluir as nossas interações e experiências sociais.
¹ Modelos de Linguagem de Grande Escala como o ChatGPT